Região Central

Estiagem volta a preocupar e já traz prejuízos no campo

Francine Boijink

Foto: Eduardo Ramos

A estiagem faz com que o homem do campo, com toda a sua proatividade e anseio por uma produção satisfatória, precise aguardar por algo que não está sob seu controle: as chuvas em volume suficiente e as condições climáticas favoráveis. Seca que já contabiliza prejuízos em municípios do centro do Estado e que preocupa em um verão que apenas se inicia, com previsão de precipitações irregulares.

O risco de uma nova seca, fenômeno que vem se tornando cada vez mais comum no Rio Grande do Sul, preocupa agricultores, pecuaristas e administradores públicos. Os danos, que já são sentidos no campo, levaram até agora três prefeituras da região a decretar situação de emergência: Agudo, Júlio de Castilhos e Tupanciretã. Os prejuízos com a falta de chuva já se aproximam de R$ 150,9 milhões, segundo levantamentos feitos pelos municípios com apoio da Emater-RS/Ascar.

Mesmo que se prospecte mais chuva para o mês de janeiro, a quantidade não deve ser considerável, em um período sob a influência do fenômeno climático La Niña. Um cenário preocupante também em uma região em que o mês de janeiro foi marcado por decretos de situação de emergência.

Em Santa Maria, a situação não é de emergência, mas já preocupa devido às chuvas irregulares. Na propriedade do agricultor Loacir Negrini, localizada no distrito de Arroio Grande, em Santa Maria, a primeira colheita de milho apresentou uma queda de até 30% na produtividade em função do reduzido volume de chuva. A plantação de arroz, que também estava sendo afetada, deu uma reagida com a recente precipitação de 30 milímetros (mm), em meio a um panorama considerado difícil pelo agricultor.

- Quando dá uma chuvinha fraca e a planta quer vir, fica 15 dias sem chover e já cai de volta. O milho deu mais ou menos até, não é muito, mas a seca está continuando. Irrigar não dá, a lavoura está longe do rio - conta Negrini, que, nesta semana, preparava a terra para a segunda plantação, com a expectativa de que, para isso, chovesse.

PREVISÃO

A previsão do tempo para o verão não é favorável à agricultura e à pecuária. De acordo com o meteorologista Gustavo Verardo, a estação que começou no último dia 21 deve ter períodos maiores de estiagem, em grande parte ocasionada pela presença do La Niña.
- Em média, o verão inteiro até março tende a ter chuva mais irregular e, principalmente, de fevereiro em diante uma condição ainda de estiagem - informa o meteorologista.
Segundo Verardo, este verão deve ser mais quente e seco do que a estação passada.

O impacto da estiagem nos municípios da região que decretaram emergência:

TUPANCIRETÃ
- O que foi afetado - Na agricultura, soja e milho. Na pecuária, produção leiteira e gado de corte. Também falta água para consumo humano na zona rural
- Prejuízo estimado - R$ 113 milhões

JÚLIO DE CASTILHOS
- O que foi afetado - Na agricultura, o milho. Na pecuária, a produção leiteira. Falta água para consumo humano na zona rural
- Prejuízo estimado - R$ 15,3 milhões

AGUDO
- O que foi afetado - Milho e fumo. Falta água para consumo humano na zona rural
- Prejuízo estimado - R$ 22,6 milhões

Agudo decreta situação de emergência

TRÊS MUNICÍPIOS JÁ DECRETARAM EMERGÊNCIA

A previsão de pouca chuva para os primeiro trimestre de 2022 fez com que a prefeitura de Agudo decretasse emergência na zona rural. No município, os danos somam R$ 22,6 milhões até agora. Estima-se que 70% da produção de milho tenha sido prejudicada, com perdas já consideradas irreversíveis. Só com o grão, o prejuízo chega a R$ 13 milhões. O fumo e a soja também foram atingidos.

O abastecimento de água potável para consumo humano no interior foi afetado, e a prefeitura está levando o produto até as propriedades rurais. Desde o início do ano, já foram distribuídos mais de 1 milhão de litros, de acordo com o prefeito Luís Henrique Kittel (PL).

- O que nos deixa também muito preocupados, e por isso, tivemos essa assinatura do decreto, é que os dias estão passando e continuamos fazendo muita entrega de água potável para a nossa população, principalmente no meio rural - relata o prefeito.


RISCO NA SOJA

Outra prefeitura que também decretou emergência por causa da estiagem foi a de Tupanciretã. Maior produtor de soja do Estado, o município já registra prejuízos econômicos ultrapassando os R$ 113 milhões. As perdas afetam a soja, o milho e a silagem. Na pecuária, os reflexos são sentidos nos bovinos de leite e de corte.

Além disso, conforme a coordenadora municipal da Defesa Civil, Vânia Vendruscolo Lopes, a água potável está sendo levada para 12 famílias do município semanalmente, e foram abertos aproximadamente 120 bebedouros para animais.

No que se refere aos prejuízos no campo, os danos já são considerados irreversíveis.

- Os prejuízos na agricultura do milho sequeiro, que já foi 85%, e do milho silagem, 90%, Esse não tem mais como reverter. O que a gente precisa agora é de uma chuva em maior volume para a soja e os bovinos de leite e de corte, que a gente consegue recuperar. Há produtores que ainda não fizeram o plantio da soja e estão no aguardo. Claro que têm aqueles que fizeram e que terão que fazer o replante - informa Vânia.

LEITE

Há mais de dois meses sem registro de chuvas em volume adequado, Júlio de Castilhos também sofre com a seca, sendo decretada emergência. A estiagem deixa reflexos na agricultura, no trato dos animais e também na falta de água para o consumo humano. Cerca de 60 pessoas, residentes na área rural ou de transição entre cidade e campo, totalizando 18 famílias, estão em situação considerada crítica, sem acesso à água potável por meio de poços artesianos.


Em relação à agricultura, o milho e o leite são os mais afetados em Júlio de Castilhos. O milho registra perdas de 25%, de acordo com o laudo técnico emitido pela Emater no dia 6 de dezembro. No grão de safra normal, o prejuízo financeiro passa dos R$ 5 milhões, e, de silagem, é de quase R$ 350 mil. Os danos são considerados irrecuperáveis.
Em relação à produção leiteira, o prejuízo financeiro é de quase R$ 10 milhões, o que representa uma perda de 30%. De acordo com a secretária de Agricultura, Ana Paula Alf Lima Ferreira, os produtores de gado leiteiro são afetados duplamente.


- Porque eles não têm água para produzir alimentação verde, ou seja, pastagem para esse animal se alimentar, e também não têm água para o consumo desse animal - diz a secretária.

SECA IRÁ ACARRETAR NA ALTA DO PREÇO DOS ALIMENTOS

Esses prejuízos no campo vão além das propriedades, com os impactos afetando os consumidores de maneira geral. Entre os itens que fazem parte do dia a dia das famílias e que devem ser impactados com o aumento de preços, por exemplo, estão o leite e os hortifrutigranjeiros. Mas não só eles, alerta o economista Alexandre Reis.

- A carne também pode ter aumento de preço por oscilação, por falta, de repente, pode ter uma escassez de gado em um cenário mais pessimista, de uma seca muito severa, como foi de 2004/2005. Ao não conseguir engordar o boi, vai afetar o mercado interno de carne e, consequentemente, vai aumentar o preço porque vai ter uma escassez de oferta - afirma.

O economista reforça, também, que os preços mais elevados já estão sendo sentidos no momento da compra dos alimentos em consequência dos custos que registraram um aumento por causa da pandemia.

- Essa inflação que temos é de oferta. Em breve, também, a escassez hídrica deve acarretar ainda mais na inflação - analisa.

Reis ressalta que o país já vive, atualmente, uma inflação de dois dígitos, que resulta na alta dos preços dos produtos. Segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a inflação oficial no país nos últimos 12 meses é de 10,74%.

Ainda segundo o economista, poderá haver uma oscilação em decorrência da utilização de outra tecnologia para a produção dos alimentos, fazendo com que o mercado se estabeleça e ocorra o equilíbrio dos preços. Mesmo assim, trabalha-se com previsão da inflação no atual patamar.

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Economia